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quinta-feira, 5 de maio de 2011

Portugal

«Mais do que nunca, a Europa tem agora essa vocação de universalidade, e podemos pensar a nossa cultura, a cultura portuguesa, contrariamente àquilo que a Geração de 70 pensava, ao considerar a cultura apenas a mais alta, a cultura-conceito, a cultura científica, e que nos separava dos outros porque nós não estávamos à altura das criações. Tudo isso desapareceu. Um coisa curiosa foi que quando os povos mais adiantados da Europa entraram em contacto com o Novo Mundo - como nós, que fomos os primeiros - a maioria deles tinha uma consciência extrema da superioridade humanística cultural. Tal como a própria Grécia considerava aqueles que não falavam grego, os outros foram vistos primeiro como bárbaros, selvagens, como se dizia. Ora, quando lemos a carta de Pero Vaz de Caminha ficamos muito admirados porque os portugueses não se espantaram com coisa nenhuma. Contrariamente àquilo que aconteceu com os conquistadores espanhóis, os portugueses nunca duvidaram que aqueles sujeitos - sobretudo as sujeitas - que eles encontraram fossem seres humanos: não só eram seres humanos, como eram seres humanos maravilhosos. Começou aí uma espécie de leitura que vai criar muitas desilusões a uns e a outros, mas na verdade podemos considerar uma benção o facto de essa nossa espécie de inocência - nossa, dos portugueses, menos hipercultivados e sofisticados em relação ao que já era a grande cultura europeia -, o facto de essa nossa ignorância divina não ter excluído da humanidade aqueles primeiros sujeitos com que nos encontrámos. (...)
Por isso eu acho que nós não temos de nos espantar de nos termos oferecido para colaborar nesta celebração da cultura europeia, que já não é a cultura europeia mitificada, hegemónica e hiperbólica, na sua pretensão de de ser o paradigma universal, da Geração de 70, que eu tanto admiro, mas que é qualquer coisa de mais modesto e ao mesmo tempo mais sábio. Eu penso que a nossa própria modéstia é uma riqueza em relação àquilo que outros países da Europa vivem, egocentricamente, pensando que a sua cultura é a cultura do paradigma universal.»

Eduardo Lourenço,Pequena meditação europeia

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