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sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Crime

«A justiça institucional, que os perseguira de modo tenaz, acaba por ceder às artes da advocacia e a influências de amigos do escritor, e os dois «criminosos» podem então viver o seu amor em paz e sossego, aliás um sossego muito relativo, devido a dificuldades financeiras, e ocorrendo entretanto o nascimento de Jorge, o segundo filho. Mas Pinheiro Alves morre dois anos depois, e eles vão então residir calmamente em São Miguel de Ceide, onde lhes nascerá o último filho, Nuno, instalando-se todos na casa do «brasileiro», que coubera a Manuel como parte da herança, que é administrada pela mãe.
Estas peripécias biográficas são úteis ao estudo das Memórias do Cárcere, não só porque o texto nelas em parte se fundamente, mas porque o leitor de hoje ganha em ponderar duas questões com elas relacionadas.
Uma das questões tem a ver com esse crime, que conduziu um homem e uma mulher à prisão, e também uma criança, já que Ana Augusta será encarcerada com o pequenino Manuel, que vai completar os seus dois e seus três aninhos na cadeia, onde vive com a mãe detida. Quer dizer: há cento e cinquenta anos, manter relações amorosas e sexuais fora do casamento, não era apenas um acto de possíveis implicações familiares e afectivas, como é na sociedade actual, em que as coisas se resolvem (ou não), no plano privado, com maior ou menor laceração emocional, acesa ou discreta disputa jurídica, violência doméstica dissimulada ou demonstrada; há cento e cinquenta anos, isso era matéria de crime severamente punível, com privação da liberdade e perspectiva de degredo para o homem, e clausura prisional ou, no mínimo, conventual, e sem direitos, para a mulher.»

Maria Alzira Seixo, «A Força da Alma, Crimes, histórias, vida e percursos da narrativa em Memórias do Cárcere», Prefácio a Memórias do Cárcere, de Camilo Castelo-Branco

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