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sexta-feira, 8 de abril de 2011

Noite

Depois de ter voltado à realidade, experimentei abrandar um pouco o passo. Mas não era possível. Aquelas vagas de homens rebentavam quais ondas de um mar encapelado e ter-me-iam esmagado como se eu fosse uma formiga.
Já não passava de um sonâmbulo. Acontecia-me fechar os olhos e era como se corresse a dormir. De vez em quando, alguém me empurrava violentamente por trás e eu acordava. O outro berrava: «Corre mais depressa. Se não queres avançar, deixa passar os outros.» Mas bastava-me fechar os olhos durante um segundo para ver desfilar todo um mundo, para sonhar toda uma outra vida.
Estrada sem fim. Deixar-se empurrar pela multidão desordenada, deixar-se arrastar pelo destino cego. Quando os SS estavam cansados, eram rendidos. A nós, ninguém nos rendia. Com os membros transidos pelo frio, apesar da corrida, a garganta seca, esfomeados, esfalfados, nós continuávamos.
Éramos os donos da natureza, os donos do mundo. Tínhamos esquecido tudo, a morte, o cansaço, as necessidades fisiológicas. Mais fortes do que o frio e a fome, mais fortes do que os disparos e o desejo de morrer, condenados e vagabundos, simples números, nós éramos os únicos homens sobre a terra.
Por fim, a estrela da manhã surgiu no céu cinzento. Um vaga claridade começava a aparecer no horizonte. Nós não podíamos mais, estávamos sem forças, sem ilusões.»

Elie Wiesel, Noite 

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