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sábado, 2 de julho de 2011

Primavera

«Por mais que as várias centenas de milhares de pessoas concentradas num território pequeno se esforçassem por desfigurar a terra em que se apertavam, por mais que a cravassem de pedras para que nada crescesse nela, por mais que exterminassem a mínima erva que brotasse, por mais que a enchessem de fumo do carvão e do petróleo, por mais que cortassem as árvores e escorraçassem todos os animais e pássaros - a Primavera era a Primavera mesmo na cidade. O sol aquecia, a erva, renascendo, crescia e verdejava por todo o lado onde não a raspassem, não só nos canteiros dos bulevares, mas entre as lajes da calçada, e bétulas, choupos e pados abriam as suas folhas pegajosas e fragrantes, os gomos das tílias inchavam até rebentarem; as gralhas-de-nuca-cinzenta, os pardais e os pombos, com alegria primaveril, já preparavam os ninhos, as moscas aquecidas pelo sol já zuniam junto às paredes. As pessoas, porém - as pessoas grandes, adultas - não deixavam de se enganar e de se magoar, a elas mesmas e aos outros. Achavam elas que o sagrado e importante não era a beleza primaveril  nem a beleza do mundo de Deus concedida para o bem de todas as criaturas - beleza que predispunha à paz, à concórdia e ao amor - mas que o sagrado e importante era o que elas próprias tinham inventado para ganharem poder umas sobre as outras.»

Lev Tolstoy, Ressurreição 

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