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quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Aborrecimento

«A capacidade para suportar uma vida mais ou menos monótona deve ser adquirida desde a infância. A este respeito, os pais modernos são bastante censuráveis; proporcionam aos filhos demasiados prazeres passivos, tais como espectáculos e guloseimas, e não compreendem a importância que tem para uma criança um dia ser igual a outro dia, excepto, é claro, nalgumas raras ocasiões. Em geral, os prazeres da infância deveriam ser aqueles que a própria criança descobrisse no seu ambiente por meio de algum esforço e imaginação. Os prazeres que excitam e ao mesmo tempo não implicam qualquer exercício físico, o teatro por exemplo, só lhes seriam facultados muito raramente. A excitação é da mesma natureza dos narcóticos que cada vez se tornam mais exigentes, e a passividade física durante a excitação é contrária ao instinto. Uma criança desenvolve-se melhor quando, tal como uma jovem planta, a deixam tranquila no mesmo solo. Demasiadas viagens, demasiadas variedades de impressões não são boas para as crianças, incapazes de suportar uma monotonia fecunda. Não quero dizer que a monotonia tenha algum mérito em si mesma; quero somente afirmar que algumas coisas boas não são possíveis senão quando há um certo grau de monotonia. Consideremos, por exemplo, o Prelúdio, de Wordsworth. Torna-se evidente a qualquer leitor que tudo o que tem algum valor nos pensamentos e sentimentos de Wordsworth seria absolutamente estranho a um jovem citadino corrompido por uma vida dissipada. Um jovem que tenha algum sério propósito construtivo, suportará voluntariamente uma dose considerável de aborrecimento se julgar que isso lhe pode ser necessário. Mas projectos construtivos não se formam facilmente no cérebro de quem leve uma vida de distracções e dissipações, pois nesse caso os seus pensamentos serão sempre orientados para os prazeres imediatos mais do que para realizações distantes. Por todas estas razões, uma geração incapaz de suportar o aborrecimento será uma geração de homens medíocres, de homens que se divorciaram indevidamente do lento progresso da Natureza, de homens nos quais murcham lentamente todos os impulsos vitais, como se fossem flores cortadas num vaso.»

Bertrand Russell, A Conquista da Felicidade

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