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sábado, 15 de janeiro de 2011

Eneias

«Onde quer que, e como quer que se pratique a arte, ela obedece a estas duas regras, sim, a obediências a estas regras é uma das virtudes essenciais do artista, e muitas vezes, se bem que nem sempre, do seu herói: se o virtuoso Eneias tivesse permanecido tão brando de coração como se poderia esperar dele, se num acesso de compaixão, ou como poeta quisesse obter um belo efeito de tensão e relutasse em matar o seu inimigo mortal, se ele, pensando melhor, não decidisse naquele momento realizar a terrífica acção, de maneira nenhuma teria sido o exemplo de brandura digna de emulação, mas em vez disso, seria uma figura tediosa e desprovida de heroismo, indigna de ser retratada em qualquer poema; quer tratasse de Eneias ou de outro qualquer e dos seus feitos, ma preocupação da arte era manter o equilíbrio, o grande equilíbrio nos limites da mais remota lonjura, era o seu símbolo indizivelmente flutuante e fugidio, que nunca acolheu em si o conteúdo isolado das coisas, mas apenas as relações porque é assim que o símbolo realiza a sua intenção, porque só nestas interligações se equilibram as contradições da existência, unidas as contradições de todas as tendências humanas - de que outro modo poderia o homem criar e compreender a arte? - brandura e crueldade unidas no equilíbrio da linguagem da beleza, no símbolo do equilíbrio entre o Eu e o Universo, no ébrio encanto de uma unidade, que perdura com o canto, mas não mais.»

Hermann Broch, A Morte de Virgílio

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