Acerca de mim

A minha foto
Oeiras, Portugal
Aluno e Professor. Sempre aluno.

segunda-feira, 14 de março de 2011

Mitzváh

«O que quer dizer para mim o Kipúr? Quer dizer sentir-me judeu. E que quer dizer sentir-me judeu? Quer dizer sentir-me eu próprio. Uma pessoa que vem de longe, que atravessou muitas vidas numa só e que sempre teve como ponto de referência o ser judeu. Ser judeu quer dizer prestar atenção, fazer o melhor possível para garantir alguma certeza a si mesmo e aos outros. Quer dizer saber ser olhado com suspeita, com inveja ou com respeito excessivo, mas de quelaquer modo como um perigo. Ser judeu quer dizer ter de defender-se, tentar construir uma força interior para não ser destruído. Ser judeu quer dizer ter a responsabilidade de levar para a frente a cultura de um povo com mais de cinco mil anos de história e que ninguém ainda conseguiu, apesar das muitíssimas tentativas, exterminar, mandar calar. Ser judeu é um exercício de modéstia. É preciso saber a priori que nem tudo é acessível a um judeu, assim como a uma pessoa de cor, a um homossexual ou um cigano.
Procurei não esquecer, em nenhuma circunstância, o facto de ser judeu e, portanto, de pertencer a um povo que, por um motivo ou por outro, sempre foi objecto de admiração, mas sobretudo de perseguição, de escárnio, de intolerância. O facto de se nascer assim pode enfraquecer ou tornar mais forte. O preconceito serve para aprender a defender-se, a lutar, a querer ser mais do que nunca nós mesmos, e mais do que nunca pertencer àquele povo de pastores errantes escolhido por Deus como povo eleito.
Quando vou ao deserto, aos países do Médio Oriente ou do Norte de África, sei que aqueles lugares são as minhas origens. Dali fugiu, depois da destruição do templo de Jerusalém, a família da minha mãe para ir para Espanha e para ser, mais tarde, expulsa pela Rainha Isabel, a Católica, e ter de se refugiar no Piemonte, donde foi novamente forçada pelas leis raciais, promulgadas em 1938 por mussolini e pelo rei Vítor Emanuel II, a emigrar para os Estados Unidos.
De Jerusalém  fugiu a família do meu pai para refugiar-se na Alemanha, depois na Alsácia e por fim nos Estados Unidos.
Na minha família falaram-se muitas línguas: o espanhol, o italiano, o inglês, o francês, o alemão, mas a única que sempre a manteve unida foi a das orações. O Shemá Israel que se reza de manhã ao acordar e o Kadish que se reza durante as funções religiosas e também quando se está de luto.»

Alain Elkann, Mitzváh

Sem comentários: