(...)A sorte parece ser antes aquilo que liberta quem a tem da cadeia dos destinos e da rede do seu próprio destino. Não é por acaso que Holderlin diz que os deuses bem-aventurados «escapam ao destino». Também a sorte e a bem-aventurança, portanto, fogem à esfera do destino, tal como a inocência.
(...) O destino revela-se, portanto, na observação de uma vida como algo de condenado, no fundo como algo que começou por ser condenado para depois ser culpado. Goethe resumiu estas duas fases nas palavras: «Vós fazeis dos pobres culpados.» O Direito não condena à punição, mas à culpa.
(...) Existe então um conceito de presente - e é o autêntico, o único, que se aplica da mesma maneira ao destino na tragédia e às intenções da cartomante - totalmente independente do do carácter, e que busca o seu fundamento numa esfera completamente diferente.
(...) ... é preciso mostrar à moral que nunca são as qualidades que são moralmente importantes, mas sim as acções.
(...) Já a visão do carácter é libertadora sob todas as formas: está ligada à liberdade (de uma forma que não pode aqui ser demonstrada) pela via da sua afinidade com a lógica.
O traço de carácter não é, portanto, o nó na rede. É o sol do indivíduo no céu descorado (anónimo) do ser humano, que projecta a sombra da acção cómica. É isto que reconduz ao seu verdadeiro contexto a profunda consideração de Cohen segundo a qual toda a acção trágica, por mais sublime que seja nos seus coturnos, projecta uma sombra cómica.»
Walter Benjamin, O Anjo da História
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