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terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Sentidos

«E - Parece-me antes que é pela razão que compreendemos que existe esta espécie de sentido interior, ao qual se refere tudo o que é captado por meio destes cinco conhecidíssimos sentidos. De facto, um é o sentido pelo qual o animal vê, e o outro aquele pelo qual evita ou deseja aquilo que percepciona através da visão. Com efeito, aquele primeiro está nos olhos, mas este último está no próprio interior da alma. Por meio dele, não só as realidades não se vêem, mas também as que se ouvem, bem como as outras realidades que se captam com os sentidos do corpo, são desejadas e tomadas pelos animais, porque lhes agradam, ou, porque os agridem, são por eles evitadas e rejeitadas.
Porém, este sentido interior não se pode chamar visão, nem audição, nem cheiro, nem paladar ou tacto. Trata-se não sei de que outra realidade que preside a todas estas como algo que lhes é comum. Como disse, é por meio da razão que a compreendemos, mas não lhe posso chamar razão, porque é evidente que ela também está presente nos animais.

A - Reconheço que existe tal realidade, seja lá o que for, e não duvido chamar-lhe sentido interior. Mas, a não ser que se ultrapasse este sentido, aquilo que nos é transmitido através dos sentidos do corpo não pode chegar a transformar-se em conhecimento. Com efeito, o conhecimento, para nós, é aquilo que admitimos depois de o ter compreendido pela razão. Mas - para não falar de outras coisas - sabemos que as cores não podem ser sentidas pelo ouvido, nem as vozes o podem ser pela vista. E, ao saber isto, não é pelos olhos ou pelos ouvidos que o sabemos, nem por aquele sentido interior, que também não falta aos animais. De facto, não é de crer que eles saibam que não é pelos ouvidos que captam a luz, nem pelos olhos que escutam as vozes, porque estas realidades só se discernem por uma atenção racional e pelo pensamento.»

Santo Agostinho, Diálogo sobre o Livre Arbítrio

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