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terça-feira, 8 de novembro de 2011

Retórica

«Entendamos por retórica a capacidade de descobrir o que é adequado a cada caso com o fim de persuadir. Esta não é seguramente a função de nenhuma outra arte; pois cada uma das outras apenas é instrutiva e persuasiva nas áreas da sua competência; como, por exemplo, a medicina sobre a saúde e a doença, a geometria sobre as variações que afectam as grandezas, e a aritmética sobre os números; o mesmo se passando com todas as outras artes e ciências. Mas a retórica parece ter, por assim dizer, a faculdade de descobrir os meios de persuasão sobre qualquer questão dada. E por isso afirmamos que, como arte, as suas regras não se aplicam a nenhum género específico de coisas.
Das provas de persuasão, umas são próprias da arte retórica e outras não. Chamo provas inartísticas a todas as que não são produzidas por nós, antes já existem: provas como testemunhos, confissões sob tortura, documentos escritos e outras semelhantes; e provas artísticas, todas as que se podem preparar pelo método e por nós próprios. De sorte que é necessário utilizar as primeiras, mas inventar as segundas.
As provas de persuasão fornecidas pelo discurso são de três espécies: umas residem no carácter moral do orador; outras, no modo como se dispõe o ouvinte; e outras, no próprio discurso, pelo que este demonstra ou parece demonstrar.
Persuade-se pelo carácter quando o discurso é proferido de tal maneira que deixa a impressão de o orador ser digno de fé. Pois acreditamos mais e bem mais depressa em pessoas honestas, em todas as coisas em geral, mas sobretudo nas de que não há conhecimento exacto e que deixam margem para dúvida. É, porém, necessário que esta confiança seja resultado do discurso e não de uma opinião prévia sobre o carácter do orador; pois não se deve considerar sem importância para a persuasão a probidade do que fala, como aliás alguns autores desta arte propõem, mas quase se poderias dizer que o carácter é o principal meio de persuasão.
Persuade-se pela disposição dos ouvintes, quando estes são levados a sentir emoção por meio do discurso, pois os juízos que emitimos variam conforme sentimos tristeza ou alegria, amor ou ódio. É desta espécie de prova e só desta que, dizíamos, se tentam ocupar os autores actuais de artes retóricas. E a ela daremos especial atenção quando falarmos das paixões.
Persuadimos, enfim, pelo discurso, quando mostramos a verdade ou o que parece verdade, a partir do que é persuasivo em cada caso particular.
Ora, como as provas por persuasão se obtêm por estes três meios, é evidente que delas se pode servir quem for capaz de formar silogismos, e puder teorizar sobre os caracteres, sobre as virtudes e, em terceiro lugar, sobre as paixões (o que cada uma das paixões é, quais as suas qualidades, que origem têm e como se produzem). De sorte que a retórica é como que um rebento da dialéctica e daquele saber prático sobre os caracteres a que é justo chamar política. É por isso também que a retórica se cobre com a figura da política, e igualmente aqueles que têm a pretensão de a conhecer, quer por falta de educação, quer por jactância, quer ainda por outras razões inerentes à condição humana. A retórica é, de facto, uma parte da dialéctica e a ela se assemelha, como dissemos no princípio; pois nenhuma das duas é ciência de definição de um assunto específico, mas mera faculdade de proporcionar razões para os argumentos.»

Aristóteles, Retórica 

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