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terça-feira, 29 de novembro de 2011

Fatalismo Russo

«Ausência de ressentimento, lucidez sobre a natureza do ressentimento, - quem sabe se as não devo também à minha grande doença! O problema não é simples: supõe uma experiência, experiência conseguida a partir da força e também a partir da fraqueza. Se alguma coisa podemos objectar ao estado de doença, é que o verdadeiro instinto de cura enfraquece e, no homem, tal instinto é um autêntico instinto de defesa. Não chegamos a desembaraçar-nos de nada; de nada nos libertamos. Tudo nos fere. Homens e coisas surgem em proximidade indiscreta; tudo quanto nos acontece deixa marcas profundas, a recordação é uma ferida purulenta.
Estar doente é propriamente uma forma de ressentimento. Contra tudo isto há um grande remédio, e um só, e eu chamo-lhe o «fatalismo russo», esse fatalismo sem revolta de que está impregnado o soldado russo que, depois de queixar-se da dureza da campanha, acaba por deitar-se em plena neve. Não tomar mais remédios, renunciar a absorver seja o que for, não reagir em caso algum... A grande razão deste fatalismo, que não é sempre, e só, valentia perante a morte, deste fatalismo conservador da vida na sua contingência mais perigosa, é o abaixamento das funções do metabolismo, o seu retardamento, uma espécie de desejo do sono hibernal. Alguns passos mais nesta lógica e ter-se-á o faquir que dorme semanas num esquife.»

Friedrich Nietzsche, Ecce Homo

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