Este cepticismo generalizado não é uma consequência do abandono da definição nominal ou explícita, no ambiente filosófico do século XX, em favor da definição implícita; ele resulta antes de uma descrença de que seja de todo possível ter uma percepção do que é o objecto Poesia, e a partir dela construir a sua definição. Para a formação desta descrença contribuiu o facto de Aristóteles ter excluído do domínio da Poesia e Poesia Lírica e ter, na verdade, identificado a esfera do poético com as grandes formas Drama e Epopeia, de tal modo que a decadência desta última, e a adopção da prosa para a maior parte da produção dramática, tornaram irrelevante a geografia conceptual de Aristóteles.
Nestes termos uma definição de Poesia só é possível a partir de uma posição meta-aristotélica, de uma posição que coloque a Poesia Lírica precisamente no foco da percepção teórica. Esta atitude de regeneração, face ao cepticismo dominante, não é frequente na Teoria da Literatura e, se excluirmos de momento o trabalho de Hugo Friedrich nesta direcção (na sua luminosa Estrutura da Lírica Moderna), só nos resta então procurar entre os filósofos um autêntico criador de enigmas, que seja acima de tudo também um oráculo, e como tal capaz de ver, tanto quanto um oráculo é capaz de ver, a Poesia Lírica como a realização suprema do munus poético.»
M. S. Lourenço, Os Degraus do Parnaso
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