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quarta-feira, 7 de abril de 2010

7 de Abril de 1963

"A tal ponto me enredei nas fascinações de não ser eu, que me chega a ser difficil fallar com o que os outros comprehendam que é sinceridade. Se me conhecesse, saberia que sou sincero na conversa normal e humana; porém a conversa normal e humana não existe por escripto nos que não sabem escrever."

Fernando Pessoa
No tempo em que ainda andava de bibe, aliás um bibe muito especial com os sinais do totobola, comecei a brincar com letras e depois fui percebendo aos poucos que com elas era possível engendrar maneiras de representar aquilo que até então me permitia comunicar por sons, por palavras ditas. Como quem faz construções de lego, eu brincava com as palavras, que me pareciam já nessa altura um campo inesgotável e me abriam uma janela para aventuras inimagináveis. Este foi um jogo que me habituei a cumprir em segredo, num segredo cumplice. Com o tempo fui dando conta do modo como as palavras são capazes de nos trair e de nos conduzirem pelos insondáveis desígnios da alma a que estão vinculadas. Contraí a doença da palavra muito prematuramente e não procuro cura, do mesmo modo que não há como curar ou remediar o facto de se nascer canhoto, ou com seis dedos numa mão. A minha doença enternece-me e relaciona-me com o mundo e comigo próprio e permite-me aspirar a, em cada momento, alcançar uma explicação, sempre provisória, para aquilo que me é dado a observar.
Foi na cumplicidade com o meu irmão mais velho que "adoeci" e a ele em grande parte devo o modo como me posiciono no mundo.
É hoje, dia do teu aniversário, mano, que te agradeço o facto de me teres mostrado, mesmo que involuntariamente, as primeiras letras e de mas teres ajudado a compor e a soletrar.

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