O diário de Victor Klemperer é um exemplo de uma história de Job. Um homem comum, com uma vida comum, vê-se, gradualmente, a caminhar e a confrontar-se com uma situação de desgraça.
O seu texto apresenta uma espécie de conta-corrente com a vida, onde vão emergindo as dificuldades crescentes por que o autor vai passando, a partir da chegada de Hitler ao poder.
Mesmo perante a adversidade de, inclusivamente, lhe ser retirada a liberdade de expressão e de lhe serem retirados os seus direitos cívicos, Klemperer assume constantemente uma atitude "olímpica", visto que nunca deixa, embora o vá fazendo de uma forma cada vez menos frequente, de manter as suas relações. Aliás, na sua rede de amizades, ou a partir dela, podemos encontrar diferentes posicionamentos políticos.
Em 27 de Março de 1933, na entrada do seu diário, podemos ler a seguinte passagem:
there is no bloodshed in the country, but oppression, oppression, oppression. No one breathes freely anymore, no free word, neither printed nor spoken.
A reacção à opressão aqui referida, encontra uma forma particular no modo como de uma maneira mais ou menos produtiva o autor se vai exprimindo. Aos poucos, parece emergir do texto um entendimento segundo o qual o último refúgio da liberdade individual se encontra no lugar recôndito do espírito e que é através da expressão que ele se manifesta e, por ela, existe. A este respeito, a entrada de 27 de Março é um exemplo daquilo que, ao longo do seu diário, Victor Klemperer vai manifestando.
Ao afirmar que "Nothing by me appears anymore. I work away quietly for myself on 'The Image of France'", o autor declara desde logo uma forma de reacção. A escrita, a expressão, passa a ser o modo a partir do qual a sua liberdade individual pode ser preservada. O lugar da sua resistência, mesmo quando, através dessa forma de resistência se afirma a falta de esperança, tal como acontece, por exemplo, na entrada de 22 de Maio de 1933, é sempre o da expressão.
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