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sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Solilóquio

Por vezes, aos amigos que me dirigem a pergunta comum: «Como estás?», respondo com as palavras que Salvatore di Giacomo ouviu do velho duque de Maddaloni, o famoso epigramista napolitano, quando, numa das suas últimas visitas, o encontrou enquanto se aquecia ao sol e lhe respondeu em dialecto: «Não vês? Estou morrendo». No entanto, este já não é um lamento que me sai do peito, mas, pelo contrário, é uma das habituais reminiscências de anedotas literárias que, curiosamente, me assaltam a memória e me alegram. Por mais melancólica e triste que possa parecer a morte, sou demasiado filósofo para não ver claramente que terrível seria se o homem não pudesse nunca morrer, encerrado no cárcere que é a vida, a repetir sempre o mesmo ritmo vital que ele, enquanto indivíduo, possui apenas nos confins da sua individualidade, e ao qual é atribuída uma tarefa que se esgota.
Contudo, outros crêem que num qualquer momento da vida este pensamento da morte deve regular aquele que permanece da vida, que se torna, assim, uma preparação para a morte. Ora, a vida inteira é preparação para a morte, e não resta fazer até ao seu fim senão continuá-la, correspondendo com zelo e devoção a todos os deveres que dela se esperam. A morte chegará de forma a meter-nos em repouso, a retirar-nos das mãos a tarefa a que procurávamos corresponder, mas não pode fazer outra coisa que não seja interromper-nos, do mesmo modo que nós não podemos fazer mais do que deixarmo-nos interromper, porque ela não nos pode encontrar em ócio estúpido.
Na verdade, esta preparação para a morte é entendida por alguns como um recolhimento necessário da nossa alma em Deus, mas, também neste caso, ocorre observar que, com Deus, estamos e devemos estar em contacto durante toda a vida e nada de extraordinário agora acontece que nos imponha uma prática incomum. As almas piedosas, frequentemente, não pensam assim, e esforçam-se por obterem os favores de Deus, através de uma série de actos que deveriam corrigir o habitual egoísmo da sua vida precedente e que, pelo contrário, constituem a expressão última deste egoísmo.

Benedetto Croce, in Dal Libro dei Pensieri

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