«O que é para um poeta ser "representativo" de uma época? Em sentido comum e mais mediano seria aquele que consagrasse os cortes e as medidas segundo a moeda corrente e os valores a ela adaptados. O que parece mais extraordinário é que esse "representativo" de uma época nunca pode aderir completamente a ela, sob perigo de ser engolido pela mesma voragem, pelo mesmo sopro tumular; há um desvio, um silêncio audível, que não foi coberto pelo palavreado dominante na época. Ora, surpreendentemente, os três poetas escolhidos como os maiores representantes poéticos da Europa, Dante, Shakespeare e Giethe, não podiam ter deixado de nascer um no século XIV, outro no século XVII e outro no século XVIII, nem podiam ter deixado de ser um italiano, outro inglês e outro alemão. Mas, mais ainda, continua Eliot, reconhecemos neles as marcas da sua terra natal, as suas particularidades, as suas convicções, partilhadas por contemporâneos e conterrâneos:
Eles [Dante, Shakespeare e Goethe] são locais devido à sua concretude: ser humano é pertencer a uma região particular da terra [...]. O europeu que não pertencesse a nenhum país seria um homem abstracto - um rosto vazio, falando todas as línguas, sem qualquer pronúncia, fosse ela nativa ou estrangeira. E o poeta é o menos abstracto dos homens, porque é o que está mais afeiçoado à sua própria língua,aliás ele não tem meios para conhecer uma outra língua tão bem, porque para o poeta explorar os recursos da sua própria língua é a tarefa a que dedica toda uma vida»
Maria Filomena Molder, As Nuvens e o Vaso Sagrado
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